Na semana passada os grandes jornais dos EUA publicaram estudos das duas maiores instituições representativas dos agricultores americanos. Os estudos tratam dos efeitos financeiros e comerciais de sobretaxação dos produtos importados da China em 60% que Donald Trump vai implantar assim que tomar posse na presidência dos Estados Unidos da América.
Os levantamentos foram feitos por consultores especializados, contratados pela American Soybean Association e pela National Corn Growers Association, associações poderosas que representam os produtores de soja e milho daquele país. Soja e milho são os principais produtos agrícolas exportados pelos Estados Unidos. Juntos, representam 25% das vendas de produtos do campo ao exterior.
Os pesquisadores demonstram que os maiores prejudicados pelas barreiras comerciais de Trump serão os fazendeiros americanos, justamente o segmento produtivo que mais ajudou a conduzi-lo novamente à presidência.
Os mesmos estudos mostram também que os maiores beneficiários da guerra comercial que Trump declarou à China serão os produtores de soja e milho do Brasil. Como Mato Grosso é líder nacional na produção de soja e milho, o estado será o principal beneficiado pelas agressivas medidas comerciais prometidas por Trump.
Abordei recentemente, em artigo nesta coluna, o tema dos efeitos das medidas comerciais de Trump para a economia de Mato Grosso. (CLIQUE AQUI e leia)
O estudo das associações é profundo e mostra a visão dos próprios agricultores americanos, suas angústias e receios com os estragos que a tensão comercial entre as duas maiores economias do mundo vai impor aos seus negócios e suas rendas.
O levantamento considera que a China vai retaliar, na mesma proporção (medidas de tarifas repetitivas), os produtos agrícolas americanos. Como consequência, as exportações desses produtos devem sofrer reduções anuais de 16 milhões de toneladas de soja e 25 milhões de milho para o país asiático. O resultado disso é o aumento das exportações agrícolas de Brasil e Argentina para a China e ampliação de áreas de cultivo de milho e soja na América do Sul. Além de ampliarem suas exportações de carnes para o mercado chinês. Em seu primeiro governo, Trump aumentou as tarifas sobre bens produzidos na China e os chineses retaliaram na mesma proporção. Somente as exportações agrícolas americanas tiveram queda de U$ 27 bilhões naquele período.
Os chineses, por sua vez, se preparam para o cenário comercial hostil com o retorno de Trump ao poder. Fortaleceram e ampliaram os laços comerciais com o Brasil. Quando esteve recentemente no Brasil, o presidente chinês, Xi Jinping, assinou 37 acordos comerciais, dos quais 7 estão diretamente ligados ao Ministério da Agricultura e Pecuária. Financiou e inaugurou um moderno porto marítimo no Peru para facilitar as exportações de países sul-americanos para seu país.
A China já é atualmente o maior parceiro comercial de Mato Grosso. Aproximadamente 43% das nossas exportações vão para aquele país asiático. Tudo indica que de 2025 a 2030 os produtores agropecuários mato-grossenses vão ampliar suas vendas para o mercado chinês, ocupando a janela de oportunidade comercial aberta pelas medidas comerciais retaliatórias do novo presidente americano. As consequências do conflito comercial EUA-China serão duradouras e a tendência é a consolidação e perenização desse mercado para os produtos agropecuários de nosso estado por meio de contratos comerciais de prazos longos.
Aos fazendeiros americanos resta a sensação de perdas duradouras e que pagarão do próprio bolso boa parte das políticas nacionalistas de Trump.
A conclusão dos estudos é dramática. As entidades afirmam que os agricultores americanos trabalharam 40 anos para construir uma forte relação comercial com a China e verão todo esse árduo trabalho ruir, ao mesmo tempo que a China desenvolve novas cadeias globais de abastecimento que devem se tornar permanentes.
Se possível fosse, poderíamos perguntar aos fazendeiros americanos porque reclamam? No setor rural dos EUA o voto é marcado pelo conservadorismo. Nos 444 condados onde a agropecuária é o motor da economia, Donald Trump obteve 77% dos votos e as medidas foram amplamente anunciadas durante a campanha. Por conseguinte, não há surpresa na nova política de comércio exterior e a escolha foi democrática e consciente.